segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

"Coisas"

Leva qualquer eu a meu dia
Dá-me paz eu só quero estar bem
Foi só mais um quarto uma cama
No meu sonho era tudo o que eu queria

Quando alguém deixar de viver aqui
Espera que ao voltar seja para ti
Nada vai ser fácil
Nunca foi
Quando alguém deixar de te dar amor
Pensa que há quem viva do teu calor
Hoje é só um dia
E vai voltar amanhã
E não foi assim que o tempo nos fez
E fez assim com todos nós
E não foi assim que a razão nos amou
E fez assim com todos nós
São coisas
São só coisas

Se uma voz nos diz que é viver em vão
Pra que raio fiz eu esta canção
E se o fim é certo
Eu quero estar cá amanhã
E não foi assim que o tempo nos fez
E fez assim com todos nós
E não foi assim que a razão nos amou
E fez assim com todos nós
São coisas
São só coisas

Eu estou bem
Quase tão bem
Vê como é bom voltar a dizer
Eu estou bem
Quase tão bem
Vê como é bom voltar a dizer
Eu estou bem
Quase tão bem
Vê como é bom voltar a dizer
Eu estou quase a viver


Ornatos Violeta - O Monstro Precisa de Amigos (1999)

sábado, 29 de novembro de 2008

depois

como vai ser
quando for só eu
e as feras?

como vai ser
quando me deixares ir
embora?

como vai ser
quando todos olharem para mim
com olhar de reprovação?

como vai ser
quando os meus olhos
não encontrarem segurança?

como vai ser
ninguém me diz
porque sou eu quem tem de saber.

quinta-feira, 28 de agosto de 2008

sim,

talvez vá ter saudades.
sinto-me nostálgico:
pelos momentos que vivi
pelas coisas que senti,
por saber que estive aqui.
o meu rasto de vida,
de suor, lágrimas e amor
paira no ar, numa cor
cinzenta, poeirenta,
como se de cinquenta
anos se tivesse tratado.

mais frases feitas e um dia:
com licença.

segunda-feira, 2 de junho de 2008

outra vez

as cordas puxam-me mais
uma vez os pés,
ou foge-me o tapete de baixo
e caio de cara no chão.
levei mais uns socos
que nem vi de onde vinham:
não os esperava.
parece que quanto mais me tiram os suportes
mais me aguento de pé.
não tenho medo,
deixem a areia cair-me entre os dedos
como se de uma ampulheta se tratasse.
que o vento a leve às dunas
e enterre os corvos
que me comiam a carne
sem eu saber.

terça-feira, 20 de maio de 2008

casulo metafórico

a larva transformou-se em mariposa,
saiu da sua casca velha e esbatida.
eis a perfeição da natureza!
olhai, curioso facto da vida:
a mesma lagarta de sempre,
mas sem medo de voar.

quinta-feira, 15 de maio de 2008

fala comigo

a minha inspiração morreu,
parece que me entupi de ideias
e o que digo não sou eu
são só palavras cheias
do vazio que me habita.

esta folha de papel
já não me diz o meu grito,
mostra-me letras doces de mel
e um sufoco que acredito
não dizer o que penso
nem sentir o quero
fico nervoso, mais tenso,
rasgo a folha e desespero.

quinta-feira, 8 de maio de 2008

amorte

nem penses.
o teu sangue insalubre
não me vai sujar as mãos.
vou só ficar a ver-te morrer,
a assistir a este espectáculo macabro.

o amor também mata
só que desta vez eu não tenho a faca na mão:
foste mesmo tu quem a espetou no coração.

quarta-feira, 30 de abril de 2008

hoje não quero título nenhum

e também não vou escrever nada. não me apetece. hoje não vou escrever um poema. hoje vou imaginar um poema. um poema que só possa ser meu. um poema simples e cru. e não mo peçam, porque não o vou dar a ninguém.




este foi o meu poema. espero que tenham gostado tanto como eu.

sábado, 26 de abril de 2008

o poema instantâneo

abra a página de edição do seu blogue e respire fundo. escreva tudo de uma vez até formar um texto homogéneo: misture sentimento a gosto com algumas translineações interessantes e figuras de estilo q.b.; adicione alguns elementos externos ao tema propensos à metaforização, vá provando para ver se precisa de mais doçura, se ainda está amargo em demasia, adicione amor. pare um pouco para reler. reescreva a primeira frase, tem vento a mais. de seguida mexa fervorosamente a mistura que obteve, por forma a criar alguns jogos de palavras. quando achar que está pronto (normalmente, quando começam a vir bolhas ao de cima da massa poética), coloque o seu poema numa forma que ache adequada à sua condição e leve ao blogue durante pelo menos uma hora. depois de publicado deixe repousar; não coma ainda quente porque faz mal à barriga.

sábado, 19 de abril de 2008

Amor é

Amor é falar sem dizer nada.
Um calor no rosto: corar
E nos olhos, uma cor molhada.
É uma falta de ar

Que aperta com força os pulmões,
É um abraço e um olhar,
É um encontro de emoções.
Que sem fim, como o mar,

Com um beijo longo nos molha
Ou em choros secos se desfolha.


Este poema foi escrito em parceria com Sara Serra.

quarta-feira, 9 de abril de 2008

embriaguez sinestésica

estou louco.
eu sei que estou louco.
não quero saber.
não me digam mais nada,
deixem-me escrever em paz.
parece que não vejo
parece que não vos vejo.
estou cego de loucura.
não me chamem mais nomes.
não me amem. odeio-vos por isso.

deixem o meu mundo sossegar,
ele gira depressa demais
e eu não entendo estas voltas,
estas mensagens que chocam contra mim
será que vos oiço? será que vos vejo?
acho-me numa embriaguez sinestésica!
não penso como devia
ou como acho que devia.
nem sinto os meus sentidos
e os sentimentos são jogos estranhos
que sabem mal: são amargos!
são como a música que não inspira
e fere os ouvidos.

enquanto me contradigo,
não te digo.
não peças mais, porque não vou dizer nada.

preciso de mais vinho.
qual é o meu copo?

quinta-feira, 27 de março de 2008

diz-me

desespero
na tentativa de
t(r)ocar os teus lábios,
pelos meus;
em vez disso
fecho os olhos, engulo a língua e inspiro outra vez
não rio, não te vejo
estás demasiado perto para te ver
hoje quero sentir.

domingo, 16 de março de 2008

as sombras.

estive a pensar nas sombras. são estranhas e difíceis de explicar. são só uma silhueta de escuridão que esconde um bocado de alcatrão quando andas na rua, mas é tão estranho. à noite chego a ter três ou quatro sombras ao mesmo tempo por causa dos candeeiros públicos que vão passando por cima de mim. e até encolhem e esticam e começam a desaparecer... conseguem esquivar-se dos carros e nunca são atropeladas, andam o dia todo a rastejar no chão, mas não parecem sujas. cruzam-se com as sombras de outras pessoas e não se confundem, nem se misturam... só estão ali. não sei, faz-me confusão. nunca percebi as sombras e sempre me fascinaram. será que quando está escuro temos sombra? será que somos a sombra? bem, não vemos nada, está escuro e é de noite.

domingo, 9 de março de 2008

Fevereiro

excerto inicial


Eu sempre soube. Nunca quis foi acreditar. Sempre soube que me traías, que não me amavas. Que não gostavas do teu filho porque também era meu. Eu sempre soube. Os sorrisos forçados de soslaio, o muro que construíste na cama. Sempre soube que não estavas comigo quando te tocava. Eu sempre soube que não. Que raiva, odeio-te tanto e não consigo deixar de te amar.

As cartas de amor e de ódio escritas e deitadas ao lixo em Dezembro, eram os desabafos de uma alma em ruínas. Foi assim que Francisco encontrou a melhor forma possível de desabafar sem morrer nem matar. Matar, sim, poderia ser uma forma de gritar e expulsar de dentro de si esta angústia terrível, uma mistura de ternura e de raiva. Estava disposto a isso se soubesse que sentiria algum alívio, se soubesse que a comida lhe saberia a alguma coisa, que um livro teria outras palavras que não o nome dela. Mas ele sempre soube que não seria capaz. Pensara quantas vezes em matar o monstro que amava, a mulher demoníaca que tinha parido o filho que sempre desejou. Mas não, nunca seria capaz, nem de a matar a ela nem de matar ninguém. De quando em vez vinham-lhe umas ganas, quais sedes de vingança, que lhe avermelhavam os olhos e salientavam as veias da testa, mas abafava-as sempre com os punhos cerrados e as unhas cravadas na palma da mão.
Por outro lado, tinha a certeza que o seu filho seria muito mais feliz se a sua mãe se mantivesse longe. Julgava que o estava a proteger de uma fera o que ameaçava de morte, arrependida de lhe ter dado a vida. Francisco estava disposto a tudo para não deixar o seu filho ser visto por aquela mulher. Para ele, ela simplesmente morreu ao dá-lo à luz. Os seus olhos tocaram-se no dia do parto, mas a partir daí, nunca mais se veriam, no que dependesse dele. Se sonhasse apenas que ela pudesse magoar o seu filho, seria capaz. Sim, tinha a certeza: matá-la-ia.

sábado, 8 de março de 2008

maré baixa

preciso de amar para escrever
se não amo, nada me flui
as palavras entopem-se
de sentidos
as palavras entopem-me
os sentidos
de sentidos
sem sentido.

isto não faz sentido.
porque os meus sentidos não têm tido
sentido.

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

re.in.vento

tango

um momento é isto:
uma bala que trespassa o coração e que mata tudo
como se se gerasse um buraco negro no seu local.
os sentimentos matam-se uns aos outros numa batalha des-
conhecida e cruel e fantástica
o sangue inunda todas as partes partidas
do corpo cadavérico, dorido dos segundos infindáveis
a que a respiração o obriga.
o ser é um resto de nadas que não há
é um egoísmo insensível, efémero pela morte que se avizinha

vai doer sempre, eu sei.
esta mistura de sentimentos mortos-vivos
de um prazer claustrofóbico e masoquista.
fiquemos só mais uma noite a ver as estrelas
a vê-las dançar no céu cor de prata.
talvez elas saibam o que é sentir.


(derivação do poema "i.", escrito por Bruno Santos e postado anteriormente,
escrita por mim)

re.in.vento

até já

tenho um monstro dentro de mim que vomita
os seus gritos
os meus gritos
toma-me as mãos, faz delas as suas
sinto que a inspiração não alimenta o meu cérebro
e desmaio no seu poder,
oiço o seu riso distante de criatura maléfica
de contos de bruxas e ogres
enquanto tento abrir os olhos, ou fechá-los, não sei bem
parece que a minha pele se escama
parece que as minhas unhas são garras
parece.
não, não parece. perece.

desaparece.


(derivação do poema "ii.", escrito por Bruno Santos e postado anteriormente,
escrita por mim)

domingo, 10 de fevereiro de 2008

escangalhar

i.

os sentimentos usurpados pelo amor
de uma cor de choro sério rindo
vivem na margem de cada dia como se fosse o último.

o teu segredo será sempre uma cor. por isso
a força dos sent/idos como uma dor em segundos
merecendo uma essência. quem sabe, se uma efémera essência,
abs/tracta, não a espera. abstraída no
esperma. porque não existem as fantasias concretamente? o corpo
não se dá, dá-se o sexo. e o sentimento re/cru/desce,
seja lá qual for o sentimento de que não falamos.


(derivação do poema "uma estrela cadente", postado anteriormente,
escrita por Bruno Santos)

escangalhar

ii.

comunico. por dentro dos vendavais. faço aquilo sem o tom dos olhos da pele.
aquilo como se outra vez roendo a rir por dentro
do texto. quando morrer, sei, não vou sozinho.
levo comigo os vendavais sentindo as mãos que lhe escrevem a pele.
sei, levo aquilo
invejando um dia menor de conhecimento pelo movimento intrínseco
à luz.

agora,
vou sair. peço imensa desculpa pelo inconveniente. é que posso ter causado
todos os vendavais do mundo. dos quais, confesso, não lembro o nome.

(derivação do poema "desta vez não sou eu", postado anteriormente,
escrita por Bruno Santos)